No auge da ditadura, fui visitar um amigo baiano que fugiu para o Rio de Janeiro e vivia na clandestinidade. Da rodoviária até a casa dele, seriam 30 minutos de carro, em condições normais. Naquelas circunstâncias, gastamos duas horas. Volta e mais voltas, caminhos diferentes do dia-a-dia, tudo para ter a certeza de que não estava sendo seguido, de que o carro já não estaria “fichado” pela repressão.
O último teste era passar bem na porta de um quartel do Exército. Isto mesmo: bem na porta dos “home”. Era um paradoxo: correr o risco pra saber se estava seguro!
A passagem pelo quartel durou cerca de 3 minutos, mas pareciam 30 minutos. O carro fazendo zigue-zague entre os tonéis e outros obstáculos metálicos colocados pelos militares pra forçar a baixa velocidade, e sentinelas olhando atentamente para o veículo. Muita tensão! A foto do meu amigo estava estampada naqueles cartazes de procurados.
Finalmente, chegamos na casa dele, num bairro distante da zona norte do Rio de Janeiro. À noite, o maior susto: durante a madrugada, quando todos dormiam, barulho de carro chegando às pressas, portas batendo, gente falando, luzes piscando e entrando pelas frestas das persianas.
Muita tensão dentro de casa. Meu amigo veste uma roupa rapidamente e diz que vai se entregar, temendo que a casa seja invadida e que algo de muito ruim aconteça com as filhas e a mulher.
- Espere, vamos ver direito o que está acontecendo – argumentou a mulher dele.
- Não. Vou sair! Assim posso evitar algo pior – disse.
Quando ele abriu a porta, viu que se tratava de uma batida da polícia procurando bandidos num terreno baldio ao lado da casa.
Meu amigo viveu muitos desses sustos. Até que um deles o infartou fulminantemente, em São Paulo, para onde fugiu depois de viver algum tempo no Rio.
Imagino bem o que deva ser isto. Tenho prima de minha mãe e seu marido, professores, que passaram por isto, também. A família sofreu um horror com a possibilidade de que algo de ruim lhes acontecesse(êle foi preso por pouco tempo). Os pais não tinham muita voz, nessas horas, em se tratando da "causa", não é? Hoje, tudo bem, ela trabalha em Brasília, 3ºescalão, no mesmo andar de Dilma(Já trabalhava nos oito anos de Lula). Somos grandes amigas, mas não falamos de política. Por isto, até IMAGINO o que vc e seus amigos passaram. Ainda bem, só imagino.
ResponderExcluirLena